Capítulo 17
✦♰✦ E Se o Papa Canalha se Tornar Competente ✦♰✦
tradução: manteiga • revisão: Dani
◈ 17. Favorecido pelos deuses
Whoosh!
O som agudo de algo cortando o ar chegou aos meus ouvidos no momento em que desviei.
Vi uma energia azul em forma de lâmina passar pelo lugar onde eu estava instantes antes.
Eram as garras do monstro, transformadas em armas afiadas por meio de sua habilidade.
Slash—
As garras erraram o golpe em mim e cortaram com precisão uma pilastra de pedra próxima, partindo-a ao meio.
A superfície lisa do corte parecia ter sido talhada por uma máquina.
As garras tinham um poder de corte impressionante.
Se aquilo tivesse me atingido, eu não só teria morrido instantaneamente, como meu corpo não teria restado inteiro.
Recuo cauteloso, tentando avaliar a situação.
‘O que foi aquilo agora? A cabeça daquela coisa…
parece feita de aço…’
Olhando mais de perto, notei que a cabeça do monstro estava envolta por uma aura mágica azul-escura.
Eu não tinha certeza, mas parecia que ele usava magia para reforçar a pele e os ossos.
Assim como uma arma infundida com energia divina se torna mais forte, a magia também poderia endurecer objetos físicos.
No entanto—
‘…Eles podem reforçar o próprio corpo assim também?’
Eu nunca tinha ouvido falar de uma técnica dessas, de alguém fortalecendo a forma física dessa maneira.
Parecia ainda mais resistente do que uma arma reforçada.
Minha maça, imbuída com energia divina, não conseguiu nem fazer um arranhão.
Enquanto eu ficava ali, momentaneamente desconcertado por essa habilidade desconhecida, o monstro soltou uma risada desagradável.
[[Ah, que pena. Eu poderia ter te matado agora há pouco.】】
— Sua cabeça é mais dura do que eu esperava. Você é um desses “cabeças-duras” de que tanto falam?
[[Ha ha, você está mesmo nos comparando a meras pedras? Sabe que somos muito mais resistentes do que isso.】】
Apontando para o meu pulso, que ainda formigava por causa do impacto anterior, o monstro riu.
[[É verdade que você é excepcionalmente forte, mas nós não passamos todo esse tempo apenas envelhecendo à toa.】】
[[Desenvolvemos nossos próprios métodos de defesa. Esse reforço que você acabou de ver é um deles.】】
Ergui minha arma novamente, encarando os monstros que ainda exibiam sorrisos arrogantes.
— Vocês falam demais.
Retrucando, tentei provocá-los.
Mas eles apenas riram, como se eu tivesse contado uma piada divertida.
Infelizmente, eu não tinha o luxo de achar graça em nada.
‘Eles não estão totalmente errados. As defesas deles são mais resistentes do que eu esperava. Nesse ritmo, minha arma vai quebrar antes…’
O impacto do último golpe ainda fazia meu antebraço inteiro formigar.
Mesmo com todos os efeitos combinados de habilidades e itens, esse foi o resultado.
Se uma das minhas habilidades se desativasse no meio da luta? A vitória seria impossível.
Felizmente — se é que dá pra chamar assim — não parecia que eles conseguiam usar esses truques indefinidamente.
Seja poder sagrado ou magia, essas energias eram apenas a “matéria-prima” para ativar habilidades.
Usar essa mesma energia para reforçar diretamente o corpo? Era ineficiente.
Um péssimo custo-benefício.
Em resumo, suas reservas logo se esgotariam.
‘Vamos desgastá-los primeiro, passo a passo…’
Imediatamente, saltei para o segundo andar.
Como o saguão do primeiro andar se estendia até o teto do terceiro, não havia necessidade de me preocupar com escadas.
O segundo andar era um ponto cego para eles.
Uma vez fora de suas linhas de visão, corri e saltei atrás dos monstros.
【【Hmm?】】
No instante em que perceberam que eu estava atrás deles, os monstros ativaram sua magia.
Logo, suas costas estavam cobertas por uma intensa camada de energia mágica.
Balancei minha maça contra ela, desta vez ajustando minha força com precisão.
Clang!
O som metálico ecoou mais uma vez, mas eu não me importei.
Continuei atacando, exatamente como planejado.
Os pescoços, a nuca, as asas… Eu não visava causar dano, mas atingir o máximo de pontos diferentes possível.
O objetivo?
Forçá-los a redirecionar a magia por todo o corpo para se defender.
E finalmente—
Thud!
Em vez do som metálico, o que ouvi foi o som de carne e músculo sendo atingidos.
O monstro não conseguiu reforçar completamente o corpo com magia.
Era um sinal: suas reservas de energia, drenadas por um uso tão ineficiente de poder, estavam finalmente se esgotando.
[[Ah, não consegui bloquear essa. Melhor acelerar o ritmo.】】
Com um semblante levemente mais sério do que antes, o monstro balançou suas garras contra mim.
Whoosh! Slash!
Apesar do tamanho colossal, seus movimentos eram tão rápidos quanto os de um rato.
Essas criaturas, maiores que elefantes, se moviam com uma velocidade alarmante, sem deixar margem para erro.
Não fui rápido o bastante para desviar completamente, e suas garras rasgaram minha coxa.
— …Ugh!
O tecido da roupa e a pele se abriram, espalhando sangue para todos os lados.
Mesmo com os efeitos dos meus buffs que amorteciam a dor, o ferimento ardia intensamente.
Agindo por instinto, e não por lógica, recuei com um salto e imediatamente alcancei uma poção de cura.
‘Não tire os olhos dos monstros. Mova-se rápido…!’
Segurei a rolha com os dentes, arranquei-a com um puxão e derramei a poção diretamente sobre o ferimento.
O líquido escorreu pela laceração em um movimento fluido — um gesto que eu já tinha repetido milhares de vezes em incontáveis batalhas.
Sem hesitação, sem movimentos desperdiçados.
No momento em que a poção poderosa — e cara — tocou minha pele, a dor desapareceu.
[[…Ei, você andou rolando por algum campo de batalha ao invés de rezar? Você não luta como nenhum sacerdote que eu conheça.】]
Claramente incomodado com a rapidez com que me curei, um dos monstros estalou a língua.
Seu tom não era mais de zombaria, mas de irritação — um sinal de que estavam começando a se cansar.
[[Essa luta é inútil. Não importa o que você faça, o resultado não vai mudar. Você só está tornando as coisas mais irritantes pra nós. Pare de desperdiçar energia e vamos acabar logo com isso. Venha aqui!!】]
— Hah, em vez de ficar bancando o durão e falando demais, talvez você devesse ter usado esse tempo pra treinar de verdade. Se tivesse feito isso, não estaria apanhando tanto de alguém mais jovem que você.
((…))
Será que acertei um nervo?
Os olhos vermelho-sangue deles — sem qualquer parte branca — escureceram com um brilho gelado.
Então, uma energia afiada e opressora começou a pressionar minha pele.
Intenção assassina.
A aura de morte que emanava deles, misturada à magia, tornou-se muito mais cortante do que antes.
[[Você realmente não sabe o seu lugar, né? Já nem é mais divertido. Tá bom então, vamos acabar com isso de verdade.】]
Com essas palavras arrogantes, o monstro abriu suas oito asas de uma só vez.
Um arrepio percorreu minha espinha.
‘Não me diga…!’
Era inconfundível.
Esse era o tipo de habilidade de ataque que eu já tinha visto antes — usada por monstros voadores de nível chefe nas masmorras de <CRW>.
O ataque era infame por seu poder devastador — uma habilidade de rank S tão absurda que os poucos sobreviventes juravam que jamais deveria ser bloqueada, apenas evitada a todo custo.
Quando os monstros se preparavam para usá-la, adotavam uma postura específica: abriam completamente as asas e curvavam as costas, exatamente como aqueles estavam fazendo agora.
‘É isso mesmo.’
Rapidamente, saquei o Escudo de Nerbloka do meu inventário.
Então, rolei até a base da escada que levava ao segundo andar e me preparei para a investida iminente.
Os monstros alçaram voo, e uma torrente de ataques desceu como uma tempestade de verão.
No último instante, canalizei energia divina para o escudo, formando uma barreira protetora.
Ratatatatat!
A habilidade que eles estavam usando se chamava “Chuva Punitiva (S).”
Desencadeava uma chuva implacável de golpes perfurantes, pulverizando indiscriminadamente tudo ao redor — fossem pedras, árvores ou seres humanos.
Sempre que essa habilidade era usada em batalhas anteriores, nada restava além de um deserto devastado.
Thud! Thud! Thud!
Cada golpe carregava uma força penetrante assustadora, martelando o chão como disparos de metralhadora.
Através da barreira translúcida, vi o piso de mármore se transformar em pó, e a escadaria que antes me servia de abrigo já havia desmoronado há muito tempo.
Com nada além do Escudo de Nerbloka para confiar, resisti à investida implacável.
Mas, de repente, um jorro quente de sangue subiu pela minha garganta e escorreu pela boca.
‘Energia divina…’
Cada vez que a barreira sofria dano, o escudo absorvia automaticamente uma grande parte da minha energia divina para reparar as rachaduras.
Graças a esse mecanismo, a barreira ainda não havia sido destruída pelo ataque.
No entanto, o custo era alto — minhas reservas de energia divina estavam se esgotando a um ritmo perigoso, mais rápido até do que ao invocar espíritos.
Minha consciência vacilava, à beira de apagar.
‘Tenho que me manter acordado…’
Rangendo os dentes, me forcei a resistir.
Se eu desmaiasse agora e a barreira desaparecesse, tudo estaria acabado.
Finalmente, quando alcancei o limite—
…Tudo parou.
O barulho ensurdecedor que enchia o ar desapareceu de repente.
A habilidade havia terminado.
[[Mas que diabos…? Você ainda está vivo?】]
O monstro pousou de volta no chão, murmurando para si mesmo enquanto me encarava, como se estivesse diante de algo que desafiava a lógica.
Não me dei ao trabalho de responder. Apenas retirei uma poção de dentro da barreira formada pelo meu escudo e a bebi em silêncio.
Não era o suficiente para me recuperar por completo, mas, sendo uma poção de alto nível, bastava para me deixar em condições de me mover novamente.
Ao endireitar as costas, o monstro se encolheu visivelmente, seus ombros até deram um leve sobressalto de surpresa.
[[Uau… Te olhando agora, está claro. Você é mesmo um apóstolo particularmente favorecido.】]
— …?
Era verdade que eu era um papa, um apóstolo do divino.
Mas ouvir demônios se referirem a mim como um apóstolo “particularmente favorecido” pela divindade era desconcertante.
Nunca me considerei especialmente favorecido por ninguém ou por nada, então só pude responder com uma expressão fechada.
— Que besteira é essa que você tá falando?
[[Por que tá se fazendo de bobo agora? Você sabe muito bem que, de todos os papas, santos e figuras sagradas da história, é você quem o divino mais favorece.】]
— Favorecido… como apóstolo?
[[Exatamente. Se você não fosse uma existência tão especial, já estaria morto. Mas olha só pra você — ainda vivo. Não te faz pensar se não tá sendo protegido diretamente pelo divino?】]
Lutei para entender aquelas palavras, tentando organizar os pensamentos embaralhados.
‘Certo. Então… este mundo claramente tem um deus. Isso é fato. Afinal, é um mundo onde o poder divino — uma extensão da presença de Deus — existe. Pra alguém como eu, vindo de outro mundo, essa realidade é difícil de aceitar, mas é inegável.’
E essas criaturas pareciam me ver como alguém escolhido por esse deus para exercer influência sobre esta terra — um apóstolo favorecido, nada menos.
— Tudo bem, vamos fingir que isso é verdade. Mas se vocês sabem disso, por que estão fazendo isso comigo? Querem atrair a ira divina mexendo com alguém “tão favorecido” assim?
Apontei para o céu, desviando sutilmente a conversa para esconder minhas reais intenções.
Era uma distração, uma tentativa de desviar a conversa para o assunto que eu realmente queria abordar.
— Se ainda não for tarde demais, por que você não desfaz essa transformação agora? Vamos continuar de onde paramos naquele sonho. Você pode me mostrar o que queria — algo sobre o Sonho do Sábio, certo? Não faria mal lidar com isso antes de continuarmos a lutar.
Dado que minhas memórias fragmentadas estavam incompletas, eu não tinha escolha a não ser ver o sonho com meus próprios olhos para descobrir o que Nikellus queria tanto saber.
No entanto, o monstro semicerrava os olhos, como se estivesse medindo cada palavra minha, antes de esboçar um sorriso e responder algo irritante:
[[Eu achei que você tinha uma cabeça boa, mas pelo jeito que está falando agora… talvez eu tenha te superestimado.】]
— O quê?!
[[O nome dela… era Luciana, não era? Não existe uma maneira real de proteger aquela cavaleira dos Esquecidos.
Te disseram que o Sonho do Sábio podia revelar um caminho? Aquilo era mentira, é claro.】]
— Espera… o quê?
Por que o nome da Luciana surgiu agora?
Pego completamente de surpresa, congelei por um instante.
Vendo minha reação, o monstro repetiu suas palavras com uma gentileza quase condescendente:
[[Não há como proteger a Luciana. Tudo bem, temos o Sonho do Sábio, mas só porque veio de um Sábio não quer dizer que contenha todas as respostas. Existem coisas que nem mesmo o sonho pode mostrar.】]
— …..
[[Não guarde rancor por ter sido enganado. A gente teve que inventar alguma coisa pra te atrair até aqui. Caso contrário, você nunca teria vindo, certo?】]
Enquanto o monstro falava, forcei minha mente a trabalhar a mil.
‘Nikellus queria descobrir algo com os videntes… Era sobre como proteger a Luciana?’
O □□□□□ □□□ □□ que o vidente havia prometido revelar no sonho…
Aquilo só podia ser “a forma de proteger Luciana”.
A peça do quebra-cabeça que eu não conseguia lembrar se encaixou de repente.
‘Mas protegê-la do quê? Dos Esquecidos? Quem exatamente são eles?’
Só pelo nome, parecia se tratar de algum grupo secreto.
“Os Esquecidos” — apagados, ocultos da luz do dia. Não parecem uma organização que atue às claras.
Talvez fossem uma espécie de sindicato criminoso subterrâneo.
‘Mas um sindicato do crime mirando na Luciana? Isso não faz sentido.’
Mesmo que Luciana não tivesse herdado o título da família, ainda era filha do prestigioso Marquês de Lazar.
Além disso, ela não era uma nobre qualquer — era uma Alta Sacerdotisa da Igreja e capitã de uma ordem de cavaleiros.
Ou seja, alguém com visibilidade demais para ser alvo de um grupo obscuro ou de criminosos comuns.
Se havia um grupo ousado o suficiente para mirar em alguém como ela — uma nobre de renome, uma Alta Sacerdotisa e comandante militar — então não era uma organização humana comum.
‘Será que é algo… que nem sequer é humano?’
Continua..